RPS Caso do Mês
May 2023
Urgência hipertensiva com injuria renal aguda – possiblidades diagnósticas
Anjali Satoskar, MD1
Dalia Y. Ibrahim, MD MSc2
Amy A. Yau, MD1
Caso clínico
Um homem caucasiano de aproximadamente 70 anos com IMC de 24.7 kg/m2 e portador de estenose da artéria carótida direita, estenose de artéria renal bilateral, hipertensão arterial maligna (renovascular), doença renal crônica estadio IV (creatinina de base 2.39 mg/dL) e síndrome de Leriche evolui com injuria renal aguda. O paciente se apresenta com pressão arterial de 165/73mmHg, proteinúria subnefrótica, oliguria, creatinina sérica 6.4-7.3 mg/dL (que se elevou até 8-9mg/dL antes da biopsia renal), potássio 4.8 mEq/L, cálcio total 8.5 mg/dL, fósforo 4.9 mg/dL, leucograma 15.2 k/uL, hemoglobina 10.0 g/dL e plaquetas 223 k/uL. Urianálise com >20 hemácias por campo, 0-5 leucócitos por campo, >300 mg/dL proteína e relação proteína/creatinina urinária 2.6. Exames de FAN, ANCA, crioglobulinas, complemento, haptoglobina, e imunofixação sérica, todos dentro da normalidade. O paciente iniciou hemodiálise e foi pulsado empiricamente com corticosteroide.
Biopsia renal
Figura 1: Aproximadamente 35% dos glomérulos estavam globalmente escleróticos. Outros glomérulos apresentavam fibrose periglomerular e tufos capilares hipoperfundidos. O interstício apresentava fibrose intersticial zonal e atrofia com tireoidização tubular. (HE, 200x)
Figura 2: Fibrose intersticial zonal e atrofia tubular atribuído a múltiplos episódios de ateroembolismo e doença obliterativa microvascular levando a isquemia zonal do rim. (Masson, 100x)
Figura 3: artérias com espessamento fibrointimal. Uma artéria arqueada com fendas de colesterol (HE, 200x)
Figura 4: outra artéria arqueada com fendas de colesterol (HE, 400x)
Diagnóstico final
Discussão
Na doença renal ateroembólica, placas são deslocadas de artérias maiores e se depositam em artérias/arteríolas intrarrenais e nos tufos glomerulares, causando oclusão microvascular e levando à isquemia e doença renal crônica. Tal fenômeno ocorre mais frequentemente após intervenções intravasculares e, raramente, acontece espontaneamente.1
Ateroembolismo foi descrito em 1862 por Panum.2 Existem três formas de doença renal ateroembólica: aguda, subaguda e crônica. Na primeira, embolização massiva ocorre alguns dias após o evento estressor. A subaguda é a forma mais frequente e ocorre de forma gradual, provavelmente causada por embolização recorrente. A Terceira forma costuma ser erroneamente diagnosticada como nefrosclerose pois ocorre de forma crônica e progressiva, em consequência de cristais liberados progressivamente durante um intervalo longo de tempo.3
Ateroembolismo ocorre mais frequentemente em homens após os 50 anos e pode envolver qualquer sítio, mas os rins são os órgãos mais frequentemente acometidos. A apresentação clínica é inespecífica e inclui injuria renal aguda, hipertensão de início recente, moderados graus de proteinúria e hematúria. O prognóstico é ruim e relacionado a doença vascular com injuria multiorgaos.4
A biopsia renal é o padrão-ouro para o diagnóstico. Entretanto, uma vez que a doença afeta o parênquima renal de forma heterogênea, a amostra pode não apresentar os achados típicos. AS fendas de colesterol ocorrem mais frequentemente em artérias arqueadas e interlobulares e são resultados da dissolução dos lipids durante a fixação em formalina. Raramente, as fendas são encontradas nas arteríolas e no tufo glomerular.6 Lesões agudas podem apresentar hemácias, fibrinas e leucócitos. Lesões subagudas podem apresentar células gigantes multinucleadas. Lesões crônicas apresentam fibrose de intima ao redor das fendas de colesterol. A obstrução vascular é habitualmente incompleta, resultando em atrofia parenquimatosa. Os tecidos frescos e não fixados podem apresentar cristais birrefringentes na luz polarizada.1 A imunofluorescência é inespecífica e a microscopia eletrônica pode apresentar apagamento dos processos podocitários, também inespecífico.
Diagnóstico diferencial
Pistas diagnósticas